BRUNO FALA SOBRE SUA TENTATIVA DE SUICÍDIO: 'DEUS COLOCOU A MÃO NAQUELE MOMENTO'



A área rural acessada por quatro quilômetros de estrada de terra dá um ar convidativo e sereno, quebrado pelo som das grandes trancas de ferro. A música “Aleluia” na entrada e as muitas frases remetendo a Deus e perdão recebem quem visita a Apac de Santa Luzia, na região metropolitana de Belo Horizonte, onde o goleiro Bruno, hoje com 31 anos, está preso há oito meses. No regime fechado, o canto do ex-futuro camisa 1 é a cama dois da cela 18 do bloco 3. Um dos 68.810 presos do estado de Minas Gerais, Bruno cumpre pena de 22 anos e três meses pela morte de Eliza Samúdio em 2010. Mas, com a progressão por dias trabalhados, a liberdade poderá ser respirada já em 2018, segundo seus cálculos. Bruno está sem advogado no momento, mas juristas consultados pela reportagem atestaram ser possível que o goleiro consiga o regime semiaberto em 2018, como o próprio almeja.



O goleiro recebeu a reportagem do Globo Esporte entre as suas funções na limpeza da capela e a prova de soldador. A rotina começa às 6h, tem três paradas para oração, refeições e horário de lazer a partir das 18h. De lá, acompanha jogos pela televisão, com misto de saudade do Flamengo e paixão pelo Atlético-MG, este estampado na meia que usou durante a entrevista e na calça que sujou de terra com as defesas no treinamento também registrado pela reportagem.



– Reconheço que eu tenho que pagar a minha dívida com a Justiça. Tudo que aconteceu vai servir de experiência. Eu vou voltar. Chega de sofrer, sabe? Eu sofri muito e fiz muitas pessoas sofrerem.

O trabalho diário, a disciplina e o bom tratamento com a família, que não precisa passar por revistas como o agachamento em espelhos no caso das mulheres, fazem com que o índice de recuperação gire em torno de 85%. Hoje no sistema comum estima-se que mais de 70% voltam a reincidir no crime.

Sem o convívio com armas e algemas por perto – não há polícia e agentes penitenciários -, o clima é bem mais leve. A religião é aliada na recuperação. A disciplina, o carro-chefe. Quem se atrasa para as atividades perde benefícios como ligação para familiares e momentos de lazer, como ver televisão. Isso tudo controlado pelo CSS, o Conselho de Sinceridade e Solidariedade, espécie de órgão regulador administrado pelos próprios detentos. Outra grande diferença para o sistema convencional está na taxa de ocupação. No sistema fechado da Apac de Santa Luzia, há espaço para 120, mas atualmente há apenas Bruno e outros 92.

– Quando você vai para uma cadeia de segurança máxima, vai para um lugar chamado COC (Centro de Observação Criminalística). Um lugar de observação durante 15 dias. Mas eu fiquei 10 meses nesse lugar. Na Nelson Hungria, eu sempre fui muito perseguido e maltratado. Os agentes penitenciários faziam muita covardia. A pressão era muito grande. Eu cheguei ao ponto de perder o equilíbrio, acabei tentando o suicídio amarrando um lençol na grade e me joguei. Acabou que Deus botou a mão naquele momento ali e não permitiu que eu tirasse a minha própria vida. Quando eu saltei da ventana, o lençol partiu. Impressionante. Foi um dos momentos mais difíceis da minha caminhada.

(Globo Esporte)

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